11.7.08

Independência ou morte

Mesmo sufocado pela indústria fonografia, o cenário da música independente ganha força no Brasil

Por Jaqueline Fernandes, Griô Produções

O reordenamento da cadeia musical no Brasil é discussão que sai cada vez mais dos ditos submundos e da marginalidade. A música independente sobrevive por mecanismos próprios, desvinculada da mídia tradicional e mais articulada do que nunca. Prova disso é a quantidade de selos, debates, feiras e associações de música independente criadas no Brasil nos últimos anos. A Associação Brasileira de Música Independente (ABMI) calcula que existam cerca de 400 gravadoras independentes no país, 90% de micro e pequeno porte. A antiga visão do cenário como um meio sem organização, onde a sustentabilidade não mostrava importância, mudou. O que fez com que artistas de renome, como Ed Mota, Maria Bethânia e Tom Zé, mesmo com possibilidades de lançar seu trabalho em grandes gravadoras, aderissem aos selos independentes. Organizados e consistentes, estes selos atuam com o mesmo poder das gravadoras internacionais, embora com menos visibilidade e oportunidade.

Ronaldo Lemos é diretor do Centro de Tecnologia e Sociedade da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas. Segundo ele existem, hoje, quatro grandes gravadoras no Brasil e estas lançaram 48 CDs de música brasileira no primeiro semestre de 2004. Os selos independentes colocaram no mercado 276 produtos nacionais. Acontece que as grandes gravadoras dominam 85% das rádios e, consequentemente, do mercado. Ronaldo conta que 48 produtos dominam o mercado de vendas. Para os selos independentes, resta apenas 3% de venda e execução. “A diferença é ocupada por uma gravadora que apenas licencia músicas e vende em formato de trilha de novela. O artista brasileiro não tem canal nos meios de comunicação tradicionais e não chega ao Brasil real”, afirma Ronaldo.

A Associação Brasileira de Músicos independentes estima que de cada 10 discos gravados no país, 7 são independentes. O músico Lobão levou por uma bom tempo a bandeira da “independência ou morte” . Ganhou destaque ao discutir por todo país o tema. Ele é responsável pelo projeto Outra Coisa, revista independente de circulação nacional em que cada edição acompanha um CD por R$12,99. A publicação traz música brasileira, lançada por selos independentes e matérias com super-doses de guerrilha cultural.
Por conta deste cenário, deu-se a proliferação de novas formas de distribuição musical. A pirataria é uma delas. Outra é a multiplicação de grupos com licenças autorais diferenciadas, capazes de viabilizar a recombinação musical em meio digital. Dados da Fundação Getúlio Vargas apontam que são lançados mil CDs de tecno-brega por ano no Maranhão. No entanto, nenhum é encontrado nas lojas porque vão direto para os camelôs, a R$ 3. O produtor negocia a venda direta. O mesmo acontece com outros estilos, como forró de Manaus. A internet acelera trocas musicais e estoura os limites legais. “O mercado musical paralelo hoje é o mercado da verdadeira música brasileira”, polemiza Ronaldo Lemos (FGV).

Os assuntos-chave na luta dos músicos, gravadoras e consumidores da música independente no Brasil envolvem o Escritório de Arrecadação e Distribuição (Ecad), a Ordem dos Músicos do Brasil (OMB), pirataria, Direitos Autorias, propriedade intelectual, recombinações musicais, novas formas de distribuição, comunica;’ao independente e comunitária, alianças entre a mídia tradicional e as grandes gravadoras, a prática do jabá, sustentabilidade, espaço e visibilidade. Sobretudo sobra fôlego e persistência. “Me dou ao luxo de ser entusiasmado. A música nasce dos pequenos absurdos do dia-dia e poesia é simplesmente percebê-los nascendo. Talvez a música tenha uma geografia muito mais misteriosa, a geografia da vontade”, desabafou Lobão no editorial de uma das primeiras edições da revista Outra Coisa.

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